Citação por WhatsApp é válida? Falta de clareza pode dificultar resolução de processos, avalia especialista
Recentemente, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça colocou em dúvida se o uso de aplicativos de conversas instantâneas pode ou não ser considerado efetivo para a comunicação de atos judiciais, como citações e intimações de cobrança. O advogado empresarial Dieter Bloemer, do escritório Flávio Pinheiro Neto Advogados, avalia que a insegurança jurídica é um dos grandes desafios nesta questão.
Com a popularização da tecnologia, especialmente dos apps de conversa instantânea, a forma de atuação do poder judiciário brasileiro também vem mudando. Uma dessas mudanças diz respeito à citação, momento em que o polo passivo de uma ação toma conhecimento oficialmente da existência do processo. Atualmente, não é incomum que plataformas como o WhatsApp sejam usadas para este fim em vista de que muitas vezes o destinatário não é localizado em seu endereço, ou, propositalmente, se oculta.
Mas, afinal, é legal e pode ser considerada a comunicação por esse meio? O advogado empresarial Dieter Bloemer, do escritório Flávio Pinheiro Neto Advogados, explica que há uma insegurança jurídica quanto ao assunto. Em decisão recente, o STJ entendeu que o redes sociais não se enquadram na modalidade citação por “meios eletrônicos”, que é uma possibilidade prevista no Código de Processo Civil. Nesta decisão o tribunal destacou apenas que redes sociais como Instagram e Facebook não podem ser utilizadas para citação, no entanto, deixou dúvida sobre o Whatsapp, que nada mais é senão uma rede social. Mas logo em seguida, outra decisão - também do STJ - apontou que "embora a citação por WhatsApp não possua autorização legal e seja nula, o vício poderá ser convalidado, se o ato tiver cumprido sua finalidade de dar ciência inequívoca ao réu acerca da ação judicial contra ele proposta"
“O que temos aqui é uma situação que pode comprometer o ato de citação e, consequentemente, atrasar a resolução de processos. Enquanto uma decisão praticamente elimina a legitimidade da citação por Whatsapp sem menciona-lo, a outra diz claramente que sua utilização faz a citação nula, porém, já coloca uma ressalva para relativizar essa nulidade. Ou seja, a posição do tribunal é confusa, pois basicamente diz que “Não pode, mas às vezes pode”. Basicamente, ficamos em uma situação de falta de clareza”, avalia o jurista.
Para Bloemer, essa situação pode dificultar ainda mais a resolução de questões como cobranças de empresas, já que o prazo de defesa começa a partir da citação e pode ser questionado se o app tenha sido utilizado para tal. “A questão é que atualmente esse app é muito utilizado e sem dúvida facilitou muito a citação/intimação de devedores que sabem como se ocultar do poder judiciário, e caso proibido de fato sua utilização, estaremos diante de um verdadeiro retrocesso para ações futuras. Já com relação as demandas que estão em trâmite, abre-se o precendente para que devedores venham a questionar a validade de um citação/intimação plenamente eficaz, o que resulta em prolongamento das ações por anos e anos, e ainda pode ao final dos processos vir a ser declarado nula uma citação ou intimação, o que levaria o processo da fase de conclusão de volta para o início, por exemplo. É muito importante que as empresas estejam atentas e seu corpo jurídico acompanhe cada etapa, para tentar evitar desdobramentos indesejados”, avalia.
Atualmente, o WhatsApp é uma das redes sociais mais usadas no país, o que justifica sua utilização para fins como o da citação. A pesquisa We Are Social aponta que 93,4% dos usuários de internet brasileiros, de 16 a 64 anos, usam o WhatsApp, o que equivale a 169 milhões de usuários.